Monday, July 30, 2007

[o espaço]*

O espaço tem tantos significados quanto as significações a ele atribuídas. É um nome: e como qualquer nome, cabe a tudo desde que se desenhe nesse tudo, um contexto.

Espaço pode ser a distância que alguns têm entre os dois dentes da frente. Pode ser a medição que se dá entre a casa e a parede de fora. Pode ser a área de lazer de uma casa: pode ser um jardim. Espaço pode ser uma folha em branco. Pode ser o silêncio entre uma nota musical e outra. Pode ser o caminho percorrido entre o elevador e a porta de entrada. Espaço pode ser uma janela. Espaço pode ser o não-conquistado: o além-Terra. Espaço pode ser os dias que se têm até o fim de uma atividade: espaço pode ser, assim, tempo.

Espaço pode ser o que ainda está vago: como uma caixa não totalmente cheia. Espaço pode ser uma gaveta: se guarda coisas em um espaço: porque a função de um espaço é, na realidade, ter funcionalidade. Mas o vácuo é também um espaço: um espaço aonde nada cabe – nem o ar. Isso porque o espaço também é desprender-se da razão: espaço é poder sonhar: é poder pensar com liberdade. Espaço é permissão.

Espaço_é_o_que_cabe_entre_duas_palavras.

Mas espaço é também divisão: convenção sobre o que pode haver em cada lugar.

Espaço é onde fica uma matéria de jornal. Espaço é recipiente de objetos. Espaço é o copo que segura o líquido; é o corpo que segura o sangue, que guarda a alma. Espaço é a trajetória de uma vida. Espaço é um disco que guarda músicas. Espaço é a distância constante das pernas ao se andar. Espaço é o que está entre a capa e a contracapa: espaço é um livro. Espaço é uma tela de pintura. Espaço é uma fotografia: que é um espaço que não mais existirá de novo. Espaço é a boca que se abre para a comida. Espaço é o interior de um carro: espaço é transporte: movimento percorrido. Espaço é cada degrau de uma escada.

Espaço é o que a luz toca – não existe espaço no escuro.

Espaço é a distância entre dois corpos. Espaço é a cama, que está no quarto, que está na casa, que está na rua, que está no bairro, que está na cidade, que está no estado, que está no país, que está no planeta, que está no universo.

E o espaço é isso: um universo a ser reinventado sempre.

~~
* Escrevi este texto em homenagem à minha dissertação de Mestrado - porque estou grávida de um filho de auto-concepção e sou mãe solteira e desempregada - e-não-tem-sido-fácil.

Monday, July 23, 2007

[porque apertar o botão 'play' é abrir a porta e deixar entrar]

Sabe o que acontece quando alguém relativamente pacata, totalmente uncool, que ama silêncio, que corre de lugares lotados e que é besta pra rir se encontra com alguém como a JANA!?

Bom, além de ter de uma hora para outra uma vida bem mais movimentada, de saber de estórias que só ela saberia [porque são coisas que só poderiam acontecer com ela], e de ter um dicionário ambulante ao seu lado que lhe explica sobre as bandas e filmes que o povo fala e que te passam batido como frase em grego... é ter seu nome mencionado perante os mil vistiantes do blog dela, para responder publicamente a uma pergunta...

Mas tudo bem, porque ela faz gracinhas e consegue o que quer mesmo. :*

Além do mais, eu realmente a-d-o-r-o desafios.
Acho que é meu lado de garota-mimada-única-filha-mulher e dos irmãos que diziam do alto de sua masculinidade: eu duvido que tu consiga fazer isso.
E eu ia lá, me estrepava todinha, mas fazia.

Mas a pergunta que dona Banana me pediu para responder é:

Qual a sua relação com música?

Os primeiros acordes que entraram na minha vida [e graças, permanecem] foram os do meu pai. Meu pai é um cara tudo de bom: pintoso, gente boa, bom marido, bom pai, corajoso, responsável, e tem uma voz linda! Quando eu era pequena, eu, como a única menina da casa, tinha uma relação carrapato com ele. E perto dele eu podia tudo. E fui super-hiper estragada - só não fui mais, porque graças a Deus minha mãe tem os pés no chão. Mas meu pai vivia a cantar pela casa - aliás, faz isso até hoje. E eu me lembro de pedir para ele: pai, canta aquela da 'namoradinha de um amigo meu'. Ou a do ET - denominação que eu hoje, aliás, tomo para mim.

O fato é que mesmo hoje, com alguns gostos musicais já definidos, eu não sei letra nenhuma de música, com exceção das-do-roberto-erasmo-nelsongonçalves-jovemguarda-&-cia que meu pai sempre cantou.

Mas apesar de não ser uma rebelde, na forma exata como os rebeldes são conhecidos pelo menos, eu tenho sim a mania de ir na contra-mão do mundo... Tanto que geralmente descubro músicos uns cinco anos depois de todo mundo já ter descoberto.

O fato é que nos meus dezesseis anos, enquanto todos dançavam a la sei-lá-que-banda-estava-fazendo-sucesso-então eu colocava meu som nas alturas e dançava com Maria Bethania e Clara Nunes.

Um ano depois, aos 17, descobri Elis. E me apaixonei por ela. Ela é a única mulher que me faz quebrar o silêncio do meu chuveiro.
Já a cantei de uma ponta a outra da América e até hoje um ex-namorado que virou um grande amigo não pode falar comigo sem falar que ao ouvi-la pensa em mim.

Mas os anos vão passando e apesar de eternamente fiel a Elis, fui descobrindo que gostava de algumas bandas que o resto do mundo amava. Meu irmão mais velho me apresentou aos Foo Fighters, aos Engenheiros, ao Legião Urbana, e a outros tantos que são queridos pela maioria - ao mesmo tempo que meu irmão mais novo me fazia odiar o forró que ele, safadinho, teimava em colocar às alturas no domingo à tarde [hoje, com ele morando longe de mim, acho que eu nem me importaria de ouvir um forró aqui e acolá - muito mais acolá que aqui, no entanto].

Aos 26, me apaixonei por um cara e eu e ele criávamos nossa própria trilha sonora.
Entre meus poemas e suas melodias, vivemos nosso amor através de músicas.

Sem falar nas músicas do meu então sogro - que é um apaixonado por músicas antigas [e conhecedor profundo delas] e que sempre me apresentava a essas e eu sempre ficava encantada.

Eu tenho uma alma velha, sabe.

Mas hoje, bem, Vanessa da Mata me faz rir com sua Quando um homem tem uma mangueira no quintal, Céu me traz um senso de alternativo à alma, Norah Jones e a perfeita mas chatíssima Diana Krall me dão paz, Zeca Baleiro e Paulinho Moska me enfeitam os ouvidos, Gal canta ainda afinado e agudo em meu som, Nelson Gonçalves de vez em quando vem me falar sobre amélias, Marisa Monte é sempre perfeita pra mim...

E como uma boa esquecida, senil sem ter ainda a idade para tal, me pego constantemente redescobrindo amores musicais.

O fato é que música para mim vem sempre agarrada a um contexto.
Acho que é por isso que eu sempre digo que a vida deveria ser mais como um musical.

O que me chega ao meu bem maior: as trilhas sonoras.
De Julie Andrews, a Audrey Hepburn, dos clássicos da Disney à Pixar, dos infantis aos adultos: eu adoro trilhas sonoras.
Seja na voz da Pocahontas, da Belle, da Victoria [ou Victor], da Eliza Doolittle, etc. - amo a todos.

E confesso que não tenho costume de deixar rádio ou cd tocando no background: música para mim ou é desejo ou é surpresa.

Então, quando quero que Elis, ou Savage Garden ou Lulu ou Nana me embalem os ouvidos - eu coloco um disquinho acolá e me delicio.

E quando ligo o rádio e está tocando uma música da Elis ou da Legião eu olho pro céu sorrindo jurando de pé junto que foi um presente para mim.

E desconhecida de tudo como eu sou, quando vou de rádio ligado para os cantos, me pego as vezes tocada, apaixonada por uma música que não conhecia e fico ansiosa, esperando falarem o nome da música para eu anotar na agendinha que sempre carrego comigo.

Existem os amores eternos, claro.
Que não são paixão passageira: Elis [será que já está claro que a amo?], Bethania, Gal, Gil, Rita, Quarteto em Cy, Tom, Vinicius, Chico, Toquinho...
Outras que sempre me fazem bem: Pizarrelli, Rosemary Clooney, Vanessa da Mata, The Corrs, Zeca Pagodinho...
Outras que são música de refletir: os cantos gregorianos e os instrumentais [únicos que eu escuto enquanto estudo]

Então, qual minha relação com música?

Bem, como disse Joseph Campbell [e é incrível como eu cito esse homem]: são felizes aqueles que são capazes de ouvir a música.

E ter músicas que te levam a cantos que ficaram no passado é poder ter sempre um pedaço desses cantos dentro de ti.

Eu só sei que tem uma música religiosa que sempre me faz chorar: numa mistura de alegria e saudade e ternura: porque quando a escuto ou canto é como se a minha avó estivesse ao meu lado de novo.

Então, música para mim é isso: pedacinhos da nossa vida que enfeitaram com acordes musicais.


Pocahontas - Cores do Vento


Do filme Victor Victoria - Julie Andrews cantando Dame from Seville


Dolores Duran - coisas boas que a tecnologia traz de volta pra gente


Gal e Elis


Minha querida Elis

Friday, July 20, 2007

[significados]

Por todas as razões que possam conquistar um sorriso
     porta de entrada
Por todas as metas e planos e sonhos
      requisitos das horas que plantam
Por todos os corações que se remendam
      verdadeiro recomeçar
Por todas as lágrimas que secam
      paz conquistada
Por todos os amores não consumados
      eternas idealizações
Por todas as memórias guardadas
      caixa de retratos na mente
Por todos os sim’s dados
      permissões
Por todos os não’s proferidos
      medos
Por todos os arrependimentos
      provas do crescer
Por todas as certezas que o tempo provou
      verdadeiras verdades
Por todas as horas
      que têm suas razões e porquês
Por todas as pessoas que são lar
      que são elas o melhor aconchego
Por todas as rezas
      dos belos que sabem pedir
Por todas as esperanças
      que o homem é o único ser que crê
Pelo sol que nasce
      novo dia
Pela noite que envolve
      pois o silêncio mora no escuro
Por todas as mãos que se dão
      abraço de duas almas
Pelos segredos trocados
      confiar
Pelos anos que envolvem vidas
      caminhar juntos
Pelos olhos que se vêem
      reconhecer
Pelas falas que sabem
      entendimento
Por todas as conquistas
      sonhos realizados
Por todas as estradas trilhadas
      escolhas feitas
Por todos os desejos
      sabor de quem sonha
Por todos os amigos
      parte de nós
Por todos os que amam
      melhor caminho
Por todos os porquês
      que o tempo traz
Por cada dia
      tempo dado de presente
Pelos anos que se acumulam
      tatuagem do tempo na alma
Por cada espaço conhecido
      estória escrita
Por todos os que sabem de nós
      cumplicidade
Por todas as palavras
      que tentarão sempre abraçar quem somos.

Wednesday, July 18, 2007

[meu não passivo ser]

FYI: O título desde post não se remete a situações em que eu mereceria dar respostas ou me defender – pois o frustrante fato cotidiano é que eu nunca sei responder à altura no momento em que a resposta à altura se faz necessária - sou daquelas pessoas que dois dias depois concluem: eu deveria ter dito isso!

No entanto, uma coisa é certa: o conselho não-participativo e não-envolvente e um tanto quanto “could care less” de “só responda o que lhe perguntarem” não cabe lá tanto na minha personalidade.

Eu tenho a compulsão de falar, de dar minha opinião, de levantar a mão em sala de aula, de me meter no bedelho alheio, de comprar briga que não é minha.

Mania cara, esta.

Principalmente vindo de uma compulsiva-obsessiva em se auto culpar e em se martelar por dias e meses a fio por palavras ditas ou não.

O fato é que sou [deveria dizer estou ] tradutora.

Não é algo que eu desgoste completamente – já que tem me dado um senso de velocidade e concentração [ believe me: people do not respect the silence] que tenho certeza me será útil no futuro – mas também não é algo que eu tenha grande prazer em fazer. E se não fosse o necessário dinheirinho e a proibição empregatícia que uma bolsa acadêmica me impõe, eu já não estaria me prestando a tal papel.

E isso acontece por vários motivos.

Mas o principal deles devo dizer: a profissão de tradutora é infeliz.

Além de ter que achar maneiras de interpretar o que o autor quis dizer quando disse o que disse, são incontáveis as vezes em que você tem o dever de traduzir algo com o que você não concorda, ou pior, exaspera.

É um aprender-a-deixar-pra-lá que verdadeiramente me incomoda.

Até porque esse é um dos defeitos do mundo: todos esquecem tudo rápido demais. A neutralidade é convenientemente super-valorizada.

E a impessoalidade de tudo me dá nos nervos.

Como diz a personagem de Meg Ryan em “Mensagem para Você”: Qual o problema com ser pessoal? Se qualquer coisa, as coisas deveriam ser mais pessoais.

Mas somos todos profissionais neste mundo globalizado ocidental.

Agora eu pergunto: se tradutores não colhem os louros de traduzir as palavras que o autor criou, podem eles receberem o infortúnio de passar adiante o que não é bom?

O que sei é que a romântica em mim odeia admitir, mas existem pelo menos 10 dores-de-cabeça minhas que poderiam ser resolvidas com um bilhete de loteria premiado.

Até lá, é aceitar o papel de adulta no mundo dos horários comerciais e agüentar o que me faz pagar as contas no fim de cada mês.

Tuesday, July 17, 2007

[cumplicidade]

Uma coisa incrível aconteceu comigo ontem.

Não sei bem se será incrível a outros olhos que não os meus, mas lhes digo que jamais esquecerei o que senti naquele momento e o olhar que troquei com a mãe que irei relatar aqui.

A equipe do laboratório de pesquisa de que faço parte saiu para os confins do campus da UNIFOR para lanchar em uma das quitandas mais escondidas: é tempo de férias, o campus está vazio, e queríamos a desculpa de caminhar um pouco mais para que o lanche também consumisse um pouco mais de tempo.

Para quem não o sabe, o campus da UNIFOR é lindo, cheio de verde, árvores e ocasionalmente algum animal menos doméstico: como “soim” [mais conhecido fora do nordeste como Sagüi], iguana, etc.



Estávamos todos conversando quando um de nós apontou: olha, um soim! Não demora muito, outro da mesa fala: olha outro!

E outro!
E outro!

Está cheio!

Dentro de poucos segundos tinham em torno de quinze macaquinhos na árvore, todos gritando muito e se comportando de forma apreensiva.

Foi quando olhamos para o chão e percebemos a causa: um macaquinho bebê havia caído no chão.

Todos os macacos da árvore queriam pegar o macaquinho mas o ambiente estava cercado de gente – além dos sete do meu grupo, havia um grupo grande de pedreiros de uma das mega-construções da Unifor – então eles não estavam certos de como se comportar e de como recuperar o bebê.

Me levantei da mesa num pulo assim que o vi no chão.
Segurei-o com cuidado em minha mão e levei-o rápido para o caule da árvore – não queria que meu cheiro ficasse no bebê. Sua mãe o esperava lá.

Ele ainda era muito novinho para se segurar, mas coloquei-o de uma forma em que o seu peso o mantivesse junto à árvore e continuei por perto com as mãos no ar em forma de concha para o caso de ele não conseguir se segurar por muito tempo.

Isso tudo se passou em segundos.

E a mãe dele me olhava atentamente para defendê-lo ante o primeiro sinal de perigo da vida do seu pequeno.

Mas não foi preciso esperar muito, assim que o coloquei na árvore, e tirei a mão de cima dele, ela, me olhando nos olhos, andou em direção ao macaquinho e o agarrou em um abraço apertado.

Com ele grudado em seu corpo, saiu. Mas não sem antes olhar de novo para mim.

O grupo de quinze macacos observou tudo, e à medida que a cena se passava, eles iam diminuindo seus gritos.

E foram-se embora, os quinze com a mãe e seu bebê.

E eu fiquei junto à árvore ainda alguns segundos, embevecida com tamanha cumplicidade e união.

Acho que não há forma melhor de testemunhar amor, do que aqueles que lutam por você quando você não pode lutar por si.

Sunday, July 15, 2007

[receita]

Eu havia escrito e postado um texto enorme aqui no meu blog. O texto falava e falava sobre palavras e verbos e como era incrível que nós fôssemos capazes de nomear nossas ações, mas que mais importante que nomeá-las, era realmente agir: colocar os verbos em ação: fazê-los atos concretos.

O que também é verdade, claro.

Eu até havia citado Molière, que diz que somos responsáveis não apenas pelo que fazemos, mas também pelo que deixamos de fazer.

E tudo isso é sim absolutamente verdadeiro.

No entanto, eu gosto de acreditar que a cada manhã nós somos um pouquinho mais inteligentes do que o que éramos quando fomos dormir: então, nesta manhã eu decidi apagar o texto que eu havia postado.

Nada há de muito dramático nisso: além das três pessoas [thank you guys] que lêem este blog por amizade a mim, e um ou outro cibernético que veio parar aqui depois de, coitado, ter procurado - pelo visto sem sucesso - algo sobre varandas para redes no Google, não mudo a vida de ninguém ao repensar sobre algo postado.

Para não muito variar trata-se apenas de um incômodo gerado em mim.

Então, como esta é sim minha sala terapêutica, onde após apertar o enigmático botão publicar jogo minhas palavras para um cosmo que não seja mais só meu, vim aqui reformular meus pensamentos e mastigar um pouco mais na matéria que me embala.

Vê, durante alguns bons anos de minha vida eu achei que tinha importância o que, ou quem, ou como... achei que seria válido se tudo fosse exatamente como era para ser. Se cada um de nós achasse fórmulas para ações que nos fizessem a cada dia pessoas que cresciam, pessoas que sabiam o que faziam, e mais que isso, que acreditavam no que faziam.

Para mim, uma ação tem que estar unida a uma convicção.

E talvez seja isso, talvez seja essa a razão de eu levar tudo tão a sério.

Mas ao contrário do que meu outro texto talvez deixasse supor, as ações não devem sempre ser vazias de palavras.

Não, não.

Eu já ouvi as palavras.

Elas são lindas.
Elas encantam.
Elas te fazem enxergar um colorido que você só é capaz de ver quando as escuta.

E não importa o destino que tantas histórias de amor e amizade tenham tomado, a verdade é que essas palavras então ditas sempre me enfeitarão. Sempre serão minhas porque a mim foram dadas.
Mas ao passar boa parte da manhã na cozinha fazendo o almoço de domingo exatamente como eu havia desejado ao acordar, eu percebi como viver é na realidade criar uma receita.

A cada um de nós são dados ingredientes e esses são misturados, separados, adicionados, marinados, assados, cozidos... a nosso bel fazer.

Somos todos cozinheiros.

[E escrever é usar as palavras como ingredientes e sair juntando cada uma como melhor lhe parecer para no fim ter o texto criado como prato final].

O fato é que eu não acredito em ações vazias de palavras – leia-se convicção. E não acredito em palavras vazias de ações. E por isso eu vim aqui colocar um texto no lugar do que eu tinha escrito: porque na verdade todos nós sabemos a receita ideal: todos nós sabemos como é bom escutar o “eu te amo”, assim como nós sabemos o quanto é incrível quando alguém ‘diz’ isso ao fazer algo que para nós é extraordinário.

O fato é que como eu digo teimosamente enchendo o saco do meu amigo Bal, a vida está aí para que acreditemos na sua enorme capacidade de fazer o próximo minuto melhor do que o minuto passado.

Acho que é essa a receita que todo domingo deve trazer.

Thursday, July 12, 2007

[ca-que-como]

Na boa, pessoas como eu deveriam vir com um manual de instruções duplo – tanto para os que convivem comigo, como para mim que convivo com os outros.

Me reporto para a adorável sonhadora Holly Golightly de Breakfast at Tiffany’s: a phoney, but a real phoney. Ou seja, talvez eu seja essa imitação barata de um livro de auto ajuda que tenta ver tudo um tanto mais cor-de-rosa do que na verdade é. Talvez eu ainda acredite em amores que duram vidas inteiras, em filhos crescendo saudáveis e cheio de amor e proteção, em homens que saiam do ordinário lugar cômodo que a modernidade lhes criou e sejam verdadeiramente homens.

Quem sabe eu ainda acredite em um monte de coisas que terminam por só existirem em minhas crenças.

Mas eu, influenciavelmente crível, continuarei crendo em tudo isso.

E se no meio tempo sou uma trapalhona, que na maioria das vezes está no lugar errado na hora errada, que é terrível em dizer não, e que aos recém-completos 28 anos – quase uma balzaquiana – ainda ri de si mesma, então, relevem-me.

Eu na verdade venho aprendendo a dançar com toda a minha ridicularidade.
De fato, às vezes levamos tempo para entender coisas que tantos já entenderam.

Eu rio com a Mônica e o Cebolinha, sou fã do Bob Esponja, gargalho no meio do trânsito se me lembro de algo engraçado, choro no meio da noite por um pesadelo ou por uma lembrança triste, sou capaz de passar horas ocupada em um desenho ou olhando plantas e formigas no quintal, vou visitar gente semi-estranha no hospital se acho que isso os fará se sentirem um pouco mais queridos e necessários, não lido bem com conflitos, adoro cozinhar as receitas que gosto, pijaminha e um filme é um programa mais que tudo-de-bom para mim, e me sinto desconcertadamente atraída por caras altos.

Confesso que há vezes em que eu, desligada e ET, me sinto um verdadeiro Joey do Friends: não entendo nada que as pessoas estão falando e fico balançando a cabeça com cara de séria e compenetrada e morrendo de fazer hora de mim mesma por dentro.

Eu acho que no fundo, sou realmente uma phony. Fico andando por aí com essa cara de gente séria e entendida quando na verdade as coisas não são bem assim.

É muito legal escutar pessoas que parecem saber do que estão falando. É show mesmo. As pessoas estão cada vez melhores em suas teorias críticas por sobre o mundo, fatos e outras pessoas.

E confesso que às vezes até me convencem realmente.

Mas sempre me vem à mente uma historinha que se passa entre o Franjinha [o inventor da turma da Mônica] e o Zé Luiz [o intelectual da turma]: o Zé Luiz, sempre muito inteligente e sabedor de tudo, tinha chegado a um nível tão elaborado de diálogo que não se fazia entender pelo resto da turma. Franjinha então lhe lança um desafio: lhe mostra uma flor e lhe pede que diga o que acha dessa.

Zé Luiz, tomado de uma inspiração poético-científica começa sua descrição elaborada: um vegetal da classe tal, que tem por características tais, e reproduz-se de tal forma e sua beleza vem sendo retratada por vários artistas dos séculos tais, tais e tais... Franjinha balança a cabeça e diz com um tom de desaprovação: Diga apenas que a flor é bonita.

Zé Luiz se vê podado de sua eloqüência: “Isso é desvalorizar sua descrição por demasiado” – frustra-se ele.

Moral da história: às vezes as coisas deveriam ser bem mais simples do que o que as pessoas as fazem.

E eu, bem, tentarei seguir acreditando em todas as coisas que fazem meu coração rir, e tentarei seguir o sábio conselho de dançar como se não estivessem me olhando.

Das duas uma: ou sou uma acadêmica medíocre, ou tomo para mim o desafio de acreditar no que a maioria não acredita.

Como eu sou eu, voto na segunda opção: e digo até que já estou acostumada com esse papel.

Elaine, um brinde, por favor! :]